SERÁ O FIM DA CAUDA LONGA?
Será que acabou a Internet como conhecemos?
10/6/20253 min ler


Bastante sem alarde, o Google acabou de fazer uma mudança que muda drasticamente a Internet como conhecemos. Para se ter uma ideia, afeta praticamente 90% dos sites mundiais. Para quem não sabe, um fundamento essencial da Internet desde seu início foi a criação da chamada "cauda longa". Cauda longa é nome que se dá para a quase infinita base de resultados de qualquer busca. Explico melhor trazendo para o mundo físico...
Numa loja tradicional, por maior que seja, o desafio é ter em quantidade suficiente os 10, 20 ou 30 produtos mais vendidos. Como são mais vendidos, a quantidade vendida é muito maior do que dos outros e, portanto, não é só ter mais estoque, mas estoque suficiente. Quanto maior for a discrepância entre os principais e os demais, mais complicada é a equação. Pense numa loja de tênis de uma única marca: é preciso ter quantidades absurdas dos principais modelos, dos principais números e de 3 tipos: masculinos, femininos e infantis. Se forem 20 modelos de cada, são 60 no total, multiplicado pelos números mais comuns (vamos suporte 3 para cada tipo), ou seja, 60 X 3 X 3 =540. Se cada um deles vender 10 unidades no mês, temos 5.400 pares (pois é) num mês só deles. Isso é o que chamamos de cauda curta, ou seja, temos um grande volume de poucos modelos que só deixam espaço para poucas unidades de outros modelos. Esse é um dos motivos do custo alto do estoque. A base é a Lei de Pareto: 10 ou 20% dos itens corresponde a 80 ou 90% do volume e/ou receita.
Num mundo digital, imagine essa mesma loja sem precisar do estoque e podendo oferecer todos os modelos que ela tem condições de comprar. Passado algum tempo, ao olhar o gráfico de vendas, ela vai continuar vendo uma concentração de muitas unidades de alguns modelos, que vão diminuindo cada vez mais até chegar perto de zero. Essa é a cauda longa. Quanto mais modelos, tamanhos e versões forem vendidas, maior a cauda.
Mas e o que tem isso a ver com o Google? Desde o declínio do Yahoo!, o Google virou uma espécie de monopólio da Internet, com 95% do total das buscas. O sucesso do Google foi saber organizar esses resultados, mostrando na primeira página o que interessa a 90% dos usuários, mas mostrando os resultados em até 100 páginas? Porque nessas 100 páginas o Google consegue entregar os interesses do total de usuários, não apenas os mais populares. Essa é a cauda longa que usamos todos os dias.
Mas não apenas nós: as ferramentas de IA também usam isso. Também para quem não sabe, a busca do Google, por sua precisão e importância, é a base de treinamento e de pesquisa também para as IAs e é aí que está o cerne da questão. Ao reduzir os resultados para 10 páginas, ainda que mostre mais depois, o Google muda a dinâmica de busca e dificulta os resultados obtidos pelos robôs das IAs. Num mundo de quantidade, a qualidade é pode ser medida por Pareto: 10% dos resultados interessam em 90% das pesquisas. Mas e num mundo de resultados específicos, precisos, sob medida? Vamos supor que você use a IA para buscar um determinado modelo de tênis que é muito raro. Nesse caso, 10 páginas de resultados podem não ser suficientes.
O que está por trás de tudo isso é a disputa de território: a tendência das pessoas é buscar as coisas cada vez mais via IA, para trazer resultados mais precisos e completos. Mesmo o Google colocando a IA automaticamente, isso não gera um treinamento para as suas buscas. E já se fala em GEO, que é a otimização e aprendizado das buscas usando a IA Generativa, gerando resultados muito mais precisos e completos, em vez de um monte de resultados indesejados junto só porque estão em evidência. Isso, por si só, já é o fim da cauda longa: o Yahoo! já exibia a cauda longa, mas os resultados eram confusos, num momento que o total de opções aumentava exponencialmente. O Google conseguiu primeiro organizar melhor esses resultados, usando o próprio comportamento do usuário para priorizar (critério qualitativo) e a relevância do site no assunto pesquisado (aspecto quantitativo). Ao passar a cobrar das empresas para aparecer na busca, ele acrescentou um terceiro pilar: a possibilidade de promover novos produtos e serviços para concorrer com aqueles que já estavam há muito tempo no mercado.
Não fosse a busca patrocinada, seria difícil lançar um novo produto ou uma nova marca e obter sucesso rapidamente. De qualquer forma, com a migração das buscas para as ferramentas de IA, exatamente pela qualidade das respostas, o Google está tentando dificultar o acesso delas, ou seja, está criando uma barreira logística.
Isso vai ser suficiente? Provavelmente, não. Mas o Google tem mostrado que ele não brinca em serviço e, depois de um período de muitas tentativas frustradas, a empresa parece ter recuperado o caminho com a IA. Você está vendo a história ser escrita. Aproveite.